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O papel da esquerda quando o Rei está nu


A divulgação das delações dos executivos da Odebrecht revelou o que já estava latente: o sistema político brasileiro está completamente podre. Um dos delatores foi direto: “não há quem tenha sido eleito sem caixa dois”. Mesmo quem não pegou diretamente, recebeu via partido. Algo que até os mármores das construções da Praça dos Três Poderes já sabiam, mas que fica agora escancarado de vez.


Segundo as delações, Temer foi anfitrião e participou da reunião, junto a Cunha, dos acertos para o PMDB. E só não entrou na lista do Fachin porque tem imunidade temporária pelo cargo que ocupa sem grandes legitimidades. A mesma sorte não teve um terço de seus ministros, que serão investigados agora pelo STF. Lula contrariou interesses da Petrobras (aquela que no slogan petista é defendida para defender o Brasil) para favorecer o Grupo Odebrecht no setor petroquímico, e foi avisado pelo patriarca da empresa que ia ter uma boa surpresa nas obras do sítio. Aécio, Alckmin e Serra, do PSDB que dizia que era tudo obra do PT, estão também encalacrados. Até no Fernando Henrique a coisa chegou. Um terço do Senado e um quinto da Câmara também estão na lista, que engordará consideravelmente se Cunha resolver abrir o bico.


Desse emaranhado, surgem dois discursos para tentar amenizar os fatos: 1) “ora, se todos faziam, não há de se crucificar ninguém. Fazia parte do jogo, e só podia entrar nele quem topasse essas regras”; 2) “As delações são fruto de abusos do Poder Judiciário e do Ministério Público. Não podem servir de prova para nada”.


Ora, o fato de a corrupção ser generalizada não significa que seja menos grave. Pelo contrário. Em troca das doações, contabilizadas ou não, a Odebrecht e demais empresas envolvidas nos esquemas foram agraciadas com projetos de lei, medidas provisórias e tráfico de influência, em uma engrenagem de privatização da coisa pública e deturpação da vontade popular expressa nas urnas que envolve todos os partidos em alguma instância de poder. Como ilustra a frase cara de pau de um dos delatados, deputado Paulinho da Força, “quem não está na lista tem pouco prestígio”. Sobre os abusos de juízes, policiais e promotores, é fato que eles existem e devem ser denunciados (o caso do blogueiro conduzido coercitivamente ou o vazamento de áudios ilegais ou de depoimentos em tempo real são exemplos pra lá de ilustrativos). Assim como não se pode negar que há uma instrumentalização das investigações por parte da grande mídia para perseguir mais a uns (Lula e PT à frente) do que a outros. Mas isso não invalida os fatos concretos que estão sendo delatados, e que são o centro da constatação de que o sistema político brasileiro apodreceu completamente. Ou alguém minimamente informado e conhecedor dos meio duvida da verossimilhança dos fatos narrados?


Em vez de se abrigar sob o manto do “todos fizeram” ou do “isso tudo é fruto de abuso dos juízes e promotores e perseguição da grande mídia”, como faz hoje o PT e mesmo setores mais à esquerda dentro ou fora do partido, assumindo uma postura conservadora que, no limite, apregoa que fique tudo como está (e que se materializa no noticiado acordão entre os ex-presidentes e o atual), o papel de uma esquerda transformadora deveria ser o de aproveitar a oportunidade gerada pela Lava-Jata, que expôs para todos que o rei está nu, para renovar a si e a suas práticas, e defender a completa renovação e reestruturação do sistema político brasileiro, no bojo da discussão de um projeto de país para o Brasil do século XXI.


O primeiro passo dessa caminhada? A cassação do atual mandato presidencial pelo TSE e a imediata convocação de eleições diretas para a sucessão de Michel Temer. Pois este Congresso que aí está, por todos os fatos revelados, não tem a menor legitimidade para eleger o sucessor do Presidente cassado.




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